O post de hoje, assim como o último, foi sugestão dos nossos leitores. Assunto super interessante e cheio de tabus.
A única certeza que existe no mundo é que todos nós vamos morrer um dia. Porém, este é um assunto “proibido” na maioria das famílias. Mas, de repente, morre uma pessoa muito próxima de seu filho e aí aquele assunto “proibido” não tem mais como ser evitado. Como falar sobre isso para a criança naquele momento tão complicado para todos e ainda lidar com os sentimentos que virão junto com a notícia?
Para os papais saberem falar sobre o assunto é preciso primeiro que tomem consciência do que a morte significa para eles próprios, como lidam com esse assunto. Pessoas que veem a morte de forma mais tranquila terão mais segurança para falar sobre o assunto, de preferência antes que ele aconteça, e para ajudar a criança quando ela tiver que passar por este momento.
O mais apropriado é que a morte seja assunto de livre acesso e não seja carregada de medos, angústias e tristezas. Isso é possível? Garanto a vocês que sim. Vou relatar a minha própria experiência com a morte quando criança para poder exemplificar que é possível passar por vários momentos de “perdas” sem trauma.
Aos seis anos eu já havia “devolvido” (não gosto de usar a palavra perdido, afinal, não somos propriedade de ninguém) quatro pessoas extremamente importantes e de convívio direto comigo (irmã, avó, prima e tio). A primeira delas que foi minha irmã. Eu tinha acabado de completar três anos, estava na maior expectativa de ganhar um/a irmão/ã. Minha mãe foi para o hospital para ganhar o neném, mas ela nasceu enforcada no cordão umbilical. Para mim foi tão marcante que eu lembro direitinho de ir tomar banho para conhecer o meu bebê e quando cheguei ao hospital, minha mãe disse que o meu bebê tinha voltado para o céu. Eu disse: ela foi ser mais uma estrelinha? Dias depois, em casa brincando, a moça que trabalhava conosco disse: “você perdeu sua irmã, Papai do céu a tomou de você” e minha resposta foi: “Eu não a perdi, pois ela está comigo, no meu coração, para sempre. E o Papai do Céu só levou o que era dele mesmo”. Minha mãe conta que ela e a moça ficaram paralisadas com minha resposta e assim percebeu a ver que eu tinha entendido e vivido aquele momento da maneira que todo mundo deveria viver, ou seja, morrer é normal. Com a minha avó e minha prima também levei muito naturalmente. Mas quando foi o meu tio, fiquei 15 dias com febre que não passava por nada. Minha mãe, muito antenada, percebeu que era algo emocional e veio conversar comigo. Então eu disse que estava com medo porque o meu tio tinha morrido, mas que poderia ser o meu pai - e aí, como seria? Tivemos uma longa conversa. Ela, em momento algum, mentiu ou passou a mão na minha cabeça, sempre foi muito realista e verdadeira. Ela disse: “Olha filha, realmente poderia ser seu pai, um dia isso acontecerá, mas nós não sabemos quando e nem como. Então, não adianta ficar doente porque quando tiver que acontecer, vai acontecer. Por isso, temos que aproveitar ao máximo uns aos outros porque a qualquer momento podemos partir”.
Quis colocar a minha vivência apenas para exemplificar que quanto mais verdadeiro você for com a criança, menos “fantasmas” serão criados na cabeça delas e, consequentemente, menos traumas serão criados.
Criança é muito esperta e sabe exatamente se você está mentindo ou não. Então, nunca minta para elas sobre este assunto. Se você estiver triste, não esconda, ela precisa saber que se sentir triste é normal e que um dia esta tristeza vai diminuir e que a saudade vai chegar. E que vocês sempre se lembrarão daquela pessoa que se foi. E que estas lembranças e a certeza de que você aproveitou ao máximo a outra pessoa é que são importantes.
Passe para ela aquilo que você acredita ser a melhor maneira de viver a morte, independentemente de crença ou religião. O importante é falar abertamente, mas claro, respeitando a capacidade de entendimento da criança. Nunca deixe uma criança sem respostas, mesmo que você não saiba, diga que irá pesquisar sobre o assunto e a chame para lhe ajudar na pesquisa.
Procure sempre saber o que ela está sentindo, peça para falar ou desenhar sobre o que é a morte para ela. Esta conversa vale tanto para quando já aconteceu o falecimento de um ente querido, como também quando assistirem a filmes, TV etc. Lembrando sempre de respeitar a vontade dos pequenos, pois há crianças que falam facilmente sobre o assunto e outras que são mais fechadas. Então, respeitem sempre o tempo delas.
Uma boa maneira de exemplificar a naturalidade da morte é mostrar para as crianças que tudo tem o seu tempo de vida, as flores depois de um tempo morrem, os animais e nós, humanos.
Outro ponto que deve ser levado em consideração neste assunto é quando a criança estiver convivendo com um paciente terminal. Ela pode e deve ser preparada durante a doença. Ela deve participar, dentro dos seus limites cognitivos e emocionais, de todo o processo do adoecer desta pessoa querida. Assim, ela terá mais facilidade em entender e consequentemente, aceitar a morte desta pessoa querida.
Também não posso escrever este post e dizer que conversando, se preparando e vivenciando tudo da forma mais natural possível, a criança viverá o luto sem nenhuma revolta, tristeza, isolamento, carência ou agressividade. Pois estes sentimentos fazem parte do luto e quando aparecerem, devem ser acolhidos e respeitados. Só devem ficar atentos se não estão exagerados porque aí cabe uma ajuda profissional.
Enfim, morrer é natural e quanto mais naturalmente tratamos o assunto, mais fácil e menos doloroso ele se torna. E usando uma frase do meu saudoso avô "A morte traz saudades, mas a gente só tem saudade daquilo que foi bom..."
Dica de livro para ajudar a conversar sobre a morte com as crianças: Este Kit de livros é muito interessante, pois inclui um guia para os pais e um livro para a criança ler, escrever, desenhar e colorir.
Editora Casa do Psicólogo
Autora: Carla Luciano Codani Hisatugo